Em minha vida profissional sempre me deparei com coisas que não aconteciam, os “não-eventos”. E ao interpelar o responsável, invariavelmente vinha um “to esperando o fulano”, “to esperando a liberação”, “to esperando o orçamento” e outras variedades de esperas. E quando eu apertava a pessoa, vinha aquele infalível, “fazer o quê”? E a culpa do não acontecimento era confortavelmente transferida para um terceiro. Num texto de Moacyr Scliar que tratava da eliminação do Brasil numa das copas do mundo, ele dizia que a frase mais comum foi o clássico “Fazer o quê?”, marca registrada do fatalismo brasileiro. Perdemos, fazer o quê? E Scliar explica:
“‘Fazer o quê?’ serve para o curto prazo, para o momento de perplexidade, de desamparo. (...) No caso, esse desamparo resulta, não do destino, mas de uma invencível compulsão. O cara que prefere a sede à água, o cara que prefere, à cabeça, a parede que vai rachar a cabeça, esse cara realmente vai se ferrar, mas não pode evitá-lo: é o seu jeito de ser, fazer o quê?
Por definição, trata-se de uma pergunta sem resposta, o símbolo da resignação. Uma resignação que, aliás, até ajuda as pessoas, impedindo-as de caírem no desespero. Numa crônica, Fernando Sabino fala de sua empregada que, numa daquelas chuvaradas devastadoras, perdeu o barraco onde morava. Além do “fazer o quê?”, a mulher produziu uma reflexão consoladora: pelo menos, ela disse, não vai faltar água para a lavoura.
Quando alguém se queixa de coisas como tristeza, sensação de inutilidade, desamparo, um norte-americano inevitavelmente dirá: ‘Do something about it’, faça alguma coisa a respeito, não fique se lamentando. Fazer, numa sociedade eminentemente pragmática, é a coisa básica. Foi pelo fazer que os norte-americanos chegaram onde chegaram, mesmo que o modelo por eles construído desagrade a muita gente.
Para a vida como um todo, a pergunta correta é ‘O que fazer?’“
Versão no Youtube: https://youtu.be/Fl_jhZGDPjY
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